Constance Moreira Modesto Pereira da Silva e Danisléia da Rosa
As eleições municipais de 2024 ocorrerão no primeiro domingo de outubro. Oportunidade em que poderemos votar em candidatas ou candidatos a vereador e em candidatas ou candidatos para prefeito. São dois votos de extrema importância para a nossa cidade e para a nossa comunidade, sendo as eleições que mais se aproximam dos debates diários.
Como escolher a eleita (o) a receber o seu voto? O que nos choca mais, uma mulher preta de direita, candidatos cooptados em partidos que não os representam somente para preenchimento das cotas, ou uma agressão entre candidatos a prefeito a maior cidade de nosso país?
O Brasil é um país majoritariamente feminino, o Censo de 2022 apontou que a população brasileira superava 203 milhões de habitantes, dessas 104.548.325 pessoas (51,5%) da população seria composta por mulheres. Enquanto 98.532.431 pessoas (48,5%), eram homens. Ou seja, somos 6 milhões de mulheres a mais que a população masculina, e porque ainda seguimos sendo minoria numérica no legislativo e executivo? Não há resposta simples ou rápida.
Ao comparar o número de mulheres eleitoras com o número de mulheres eleitas, nos confrontamos com a difícil realidade de que os resultados efetivos ainda não parecem ter atingido um patamar compatível com a equidade almejada.
Em nível nacional, segundo dados do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), as mulheres são 53% do eleitorado (82 milhões). No entanto, em 2022, o número de mulheres eleitas não superou 15%.
Desde a adoção do regime democrático em nosso país, nós mulheres fomos excluídas e desconsideradas, nosso direito ao voto foi concedido somente em 1932, ou seja, trata-se de direito jovem e conquistado através de muita luta daquelas que carregavam as pautas feministas.
E mesmo tardio, o voto feminino possuía ressalvas. Apenas as mulheres viúvas ou solteiras com renda própria poderiam votar. As mulheres casadas, ainda que também tivessem renda própria, fruto de atividade profissional, somente poderiam votar se autorizadas pelo marido.
O Decreto 21.076 de Getúlio Vargas, isto é, o novo Código Eleitoral, publicado em 24 de fevereiro de 1932, acolheu o voto feminino sem condições excepcionais. As mulheres poderiam votar e ser votadas.
Posteriormente, em 3 de maio de 1933, realizou-se em todo o país a eleição para os representantes na Assembleia Constituinte. Bertha Lutz saiu candidata a uma cadeira de deputada na assembleia. Sete mulheres candidataram-se à Constituinte, todas pelo Distrito Federal (que àquela época ficava no Rio de Janeiro): Leolinda Daltro, Natércia da Silveira, Bertha Lutz, Ilka Labarte, Georgina Azevedo Lima, Tereza Rabelo de Macedo e Julita Soares da Gama. Dessas candidatas, Bertha foi a que recebeu a maior votação: 16.423 votos. Entretanto, esse número não foi suficiente para assegurar uma cadeira na Câmara, o que garantiu a Lutz a primeira suplência do Partido Autonomista.
A Constituição que se seguiu e entrou em vigor em 1934, consolidou o voto feminino, conquista do movimento feminista. Instituindo o direito ao voto, sem restrições de estado civil. Tornando- o facultativo para as mulheres, exceto para as servidoras públicas, que eram obrigadas a votar.
Carlota Pereira de Queirós tornou-se a primeira mulher eleita a assumir uma cadeira na Câmara dos Deputados. Bertha Lutz, novamente eleita deputada suplente pelo Partido Autonomista, tomou posse na Câmara dos Deputados em 1936 em virtude do falecimento do titular. Tornando-se a segunda deputada do Brasil.
Em 1934, o estado de Santa Catarina elegeu Antonieta de Barros, a primeira deputada estadual negra. Sua pauta mais relevante era a concessão de bolsas de estudo para alunos carentes, a parlamentar negra pioneira, carregava como bandeira política o poder revolucionário e libertador da educação para todos. Foi ela a responsável pela criação do Dia do Professor.
A Constituição de 1946 não retrocedeu quanto ao direito de voto das mulheres, tornando-o então obrigatório para aquelas alfabetizadas. A história do voto às mulheres registra restrições de fundamento religioso e racial. Inicialmente, a concessão do voto alcançou apenas mulheres solteiras antes de mulheres casadas serem admitidas como eleitoras, considerando que estas seriam propriedade de seus maridos, era imposta a condicionante autorizadora.
Em 31 de maio de 1976, Eunice Michilles tornou-se a primeira mulher senadora ao tomar posse na vaga do titular, o senador João Bosco, que falecera.
Somente em 1988, com o advento da Constituição cidadã e retomada democrática, que o direito se estendeu a homens e mulheres analfabetos.
O que nos chama a atenção, é que nas eleições de 2022 apenas duas mulheres foram eleitas governadoras. Fátima Bezerra (PT) foi reeleita para governar o Rio Grande do Norte no primeiro turno e Raquel Lyra (PSDB) é a primeira mulher a governar o estado de Pernambuco. Ao analisarmos as eleitas para a Câmara dos Deputados, temos somente noventa e uma mulheres. No Senado Federal não somamos mais de dez mulheres.
A sociedade e o sistema político brasileiro é patriarcal, racista, misógino e excludente. O Senado Federal levou 55 anos para construir banheiro feminino em suas instalações. Apenas em 2016 as senadoras puderam contar com banheiro feminino no plenário, antes era necessário que se ausentassem, se dirigindo até o restaurante
Como esse ano o pleito é municipal, um estudo da Confederação Nacional dos Municípios (CNM) revela que somente 35% das cidades apresentam alguma candidata na disputa. Já para os homens, o índice é de 98% dos municípios.
O estudo ainda revela ainda que 52% das candidatas a prefeita se concentram em cinco partidos: MDB (13%), PT (11%), PSD (10%), PL (9%) e União (9%). Além disso, o pleito deste ano terá pela primeira vez candidaturas exclusivamente femininas em 101 cidades. Dessas, 24 terão candidatura única.
O que está acontecendo que as mulheres não estão sendo eleitas e somamos tão poucas candidaturas?
Entretanto, para estarmos representadas efetivamente não basta que votemos em mulheres, temos de estar atentas às pautas que essas mulheres carregam, sobretudo quando se trata de direitos das mulheres, principalmente quando confrontadas com relação a direitos reprodutivos e saúde da mulher.
Não basta apenas eleger uma mulher, é necessário que essa mulher represente os valores que nos são caros. Que esta pense realmente no coletivo, que suas propostas sejam realmente progressistas. Que trabalhe para uma sociedade mais justa, igualitária, inclusiva para todas as mulheres e meninas. Que busque atuar para que mais mulheres tenham acesso a saúde, educação, cultura e políticas que representem avanços para todas.
Sem uma candidata que realmente nos represente, não faz sentido eleger uma mulher que não nos representa. Como bem dito por Sueli Carneiro, “Eu, entre esquerda e direita, continuo sendo preta.”
Ao escolher sua candidata ou seu candidato, esteja atenta a quem ele representa! O voto é secreto e obrigatório, precisamos valorizar esse direito e usá-lo com sabedoria.
Referências
https://www.camara.leg.br/midias/file/2020/11/voto-feminino-brasil-2ed-marques.pdf