CORTE INTERAMERICANA DE DIREITOS HUMANOS E PROTEÇÃO DOS DIREITOS DAS MULHERES: O CASO GONZÁLEZ Y OTRAS (“CAMPO ALGODONERO”) VS. MÉXICO (2009) E SEUS IMPACTOS NA VIOLÊNCIA DE GÊNERO

Bianca Maruszczak Schneider van der Broocke 

No mesmo ano em que foi eleita a primeira mulher presidente do México, há outro marco histórico para o feminismo a ser comemorado, os 15 anos da sentença da Corte Interamericana de Direitos Humanos (CIDH) no caso González y Otras (“Campo Algodonero”), que teve um impacto profundo na forma como a violência de gênero é tratada na América Latina, estabelecendo precedentes importantes para a proteção dos direitos das mulheres e a responsabilização dos Estados pela prevenção e investigação de crimes de violência de gênero. A decisão também reforçou a necessidade de políticas públicas específicas e ações concretas para combater a discriminação e a violência contra as mulheres.

Julgado pela CIDH em 2009, este caso envolveu o assassinato e desaparecimento de três mulheres jovens em Ciudad Juárez, no México, no ano de 2001, Claudia Ivette González, Esmeralda Herrera Monreal e Laura Berenice Ramos Monárrez, cujos corpos foram encontrados em um campo de algodão (Campo Algodonero). Esses assassinatos foram parte de uma série de homicídios de mulheres na região, caracterizados pela violência extrema e impunidade. As investigações foram marcadas por irregularidades, incluindo a falta de diligência na coleta de provas, a demora nas apurações e a ausência de uma perspectiva de gênero na abordagem dos crimes. O Estado mexicano foi acusado de não tomar medidas adequadas para prevenir a violência contra as mulheres, investigar os crimes de maneira eficaz e proporcionar justiça às vítimas e suas famílias.

Na sentença, além de considerar o Estado mexicano responsável por não adotar medidas preventivas necessárias e por falhar na devida diligência nas investigações dos desaparecimentos e assassinatos das jovens, a CIDH enfatizou a obrigação dos Estados de prevenir e erradicar a violência de gênero e a discriminação sistêmica contra as mulheres, destacando a importância de políticas públicas eficazes e a necessidade de uma resposta judicial adequada.

Além disso, a CIDH sublinhou a importância de incorporar uma perspectiva de gênero em todas as etapas de investigação e na formulação de políticas públicas para combater a violência contra as mulheres. Nesse caso em específico, a Corte reconheceu e passou a se referir ao tipo de crime praticado como “homicídio de mulher por razões de gênero, também conhecido por feminicídio”, para fins de atribuição de responsabilidade ao Estado pelas violações de direitos humanos ocorridas em seu território. Foi a primeira vez que o termo “feminicídio” foi empregado em uma Corte Internacional.

A decisão incluiu medidas de reparação para as famílias das vítimas, como compensações financeiras, reabilitação psicológica e a criação de um memorial para as vítimas de feminicídio em Ciudad Juárez. E, a fim de garantir que tais violações não se repetissem, impôs ao Estado mexicano a obrigação de adotar medidas específicas de não repetição, tais como:

 – Reformas Institucionais e Legislativas: O Estado foi obrigado a implementar políticas públicas e reformas legais para prevenir a violência de gênero e garantir uma resposta adequada e a proteção efetiva dos direitos das mulheres.

– Capacitação e sensibilização: A CIDH ordenou a implementação de programas educacionais que abordassem a discriminação de gênero e de programas de capacitação e sensibilização para funcionários públicos, especialmente aqueles envolvidos na aplicação da lei e no sistema judicial, sobre a violência de gênero e os direitos das mulheres.

– Adoção de protocolos de investigação: A CIDH exigiu que o México adotasse protocolos especializados para investigar casos de violência de gênero e feminicídios de forma eficaz e com perspectiva de gênero, bem como a criação de um banco de dados nacional sobre mulheres e meninas desaparecidas.

 O princípio da não repetição é um dos pilares fundamentais do direito internacional dos direitos humanos e está intimamente ligado ao conceito de reparação integral. Esse princípio exige que os Estados adotem medidas não apenas para reparar as violações cometidas, mas também para evitar que ocorram novamente no futuro. Para tanto, envolve a implementação de medidas concretas e efetivas que tratem das causas subjacentes às violações.

Nesse contexto, o caso González y Otras (“Campo Algodonero”) foi um catalisador para importantes reformas e ações no México, focadas na proteção dos direitos das mulheres e na prevenção da violência de gênero. As medidas impostas pela CIDH, com base no princípio da não repetição, exigiram mudanças estruturais e educacionais que têm impactado diversas áreas da sociedade, incluindo a esfera da política. As reformas e a crescente participação das mulheres na política são evidências de um progresso significativo, embora ainda haja desafios a serem enfrentados para garantir a plena igualdade de gênero e a erradicação da violência contra as mulheres.

A participação política das mulheres no México tem avançado significativamente, refletindo um compromisso crescente com a igualdade de gênero, impulsionado por decisões como a quinzenária “Campo Algodonero” e pelas medidas de não repetição. Este caso serve como um exemplo significativo de como a Corte pode influenciar mudanças sistêmicas nos países latino-americanos para proteger e promover os direitos humanos, especialmente os direitos das mulheres.

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