Adriana Oliveira
O censo de 2022 aponta uma maior proporção da população feminina, dentro dessa dimensão as pesquisas nos mostram que a maioria das mulheres são negras, dito isto, preciso explicar que não tenho a pretensão de me debruçar sobre um estudo estatístico acerca da população feminina negra no Brasil (confesso que não ousaria fazer essa caminhada pelos corredores de Exatas).
O que pretendo lhes trazer por meio desse texto, que pode soar até um pouco indigesto inicialmente, é um convite à reflexão: a raça em considerável parte da jornada, virá antes do gênero.
É fato que a violência de gênero tem se mostrado catastroficamente democrática, ela invade distintos espaços de poder, classes sociais, profissões e raças, entretanto, precisamos nos atentar, e ter a sensibilidade para assimilar que a violência de gênero e suas consequências ainda são consideravelmente vultosas contra a mulher negra.
A magnifica Bell Hooks, em sua obra *Irmãs do Inhame*, título que reflete a solidariedade genuína que habita entre nós, mulheres negras, irmãs, conhecedoras tão profundas das dores que nos atravessam, a metáfora faz referência ao fato de sermos e estarmos tão conectadas quanto as raízes de inhames que crescem juntas ao subsolo. Mas avançando a questão central que quero citar, em um determinado capítulo deste livro, Bell Hooks, fala sobre o ato de fazer uso da verdade, confrontar as verdades mesmo que desconfortáveis, é passo importante para se buscar mudanças sociais significativas e nos insurgirmos contra as opressões que atacam nossa existência.
Quando uma de nossas irmãs sofre qualquer espécie de violência por conta “a priori” do gênero, e busca suporte para enfrentamento dessa violência, seja ajuda médica, assistência jurídica e tantas outras formas de suporte e/ou proteção, que nosso sistema (oferece?), e mesmo assim, inicia esse atendimento sendo maltratada desde o primeiro momento, seja com a falta de empatia que deveria ser requisito básico nestes espaços, sofrendo os mais diversos constrangimentos, só demonstra que sofremos uma tríade discriminatória, que é ser negra, mulher e em parte considerável, hipossuficiente.
Ser mulher negra é fazer parte de um grupo hipervulnerabilizado, e quando se trata de violência de gênero, ainda estamos distantes de sermos acolhidas como pessoas dignas de proteção.
Encerro essa reflexão, desejando que a sociedade possa firmar entendimento de que mulheres negras, além da questão de gênero, acumulam marcadores sociais.